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Entenda como funcionam as cotas (raciais, sociais e PCD) e por que elas são importantes

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Um dos temas mais intensamente discutidos e cercado de inúmeras polêmicas é o das cotas sociais, PCD (pessoas com deficiência) e raciais.

Apesar de ser um assunto de debates já há diversos anos e haver leis que tratam desse aspecto, ainda há quem questione a validade e legitimidade desse tipo de medida.

Com as eleições se aproximando e candidatos polêmicos fazendo afirmações controversas, sem falar nas inúmeras fakes news que circulam pela Internet, se faz necessário uma análise detalhada e profunda sobre como funciona o sistema de cotas e por que elas são relevantes.

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As cotas para pessoas com deficiência em concursos públicos

No que se refere à cotas para pessoas com deficiência em concursos públicos,  o Decreto nº 3.298, que delibera sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, dispõe em alguns artigos (3 e 4) sobre o que é considerado deficiência, deficiência permanente e incapacidade e em quais categorias a pessoa com deficiência pode se encaixar.

Outros artigos desse mesmo decreto também falam a respeito da reserva de vagas para pessoas com deficiência.

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As cotas sociais e raciais nas universidades públicas

No dia 29 de agosto de 2012, foi aprovada uma lei federal, de nº 12.711 que instituía as cotas em faculdades e universidades. Essa lei não determina somente a porcentagem das vagas voltadas para suprir suas demandas, mas também a divisão dessas vagas.

Há três tipos de cotas distintas que visam beneficiar as seguintes categorias sociais:

  • Alunos oriundos da rede pública de ensino;
  • Candidatos que possuem uma renda familiar mensal abaixo de um salário mínimo e meio por pessoa;
  • Candidatos (de acordo com nomenclatura da própria lei) negros, pardos e indígenas.

De todas as vagas oferecidas em cada curso, as cotas em universidades precisam ser divididas do seguinte modo:

  • 50% das vagas devem ser reservadas para alunos da rede pública. Os 50% restantes são livres para ampla concorrência;
  • 50% das vagas são reservadas para os alunos de escolas da rede pública (desse modo, 25% do total) são reservadas para candidatos com renda abaixo de 1,5 salário mínimo para cada indivíduo da família. A outra metade é voltada para os alunos de escola pública com renda familiar acima desta;
  • Destes dois grupos, no mínimo o percentual equivalente ao indicativo do IBGE em relação ao percentual populacional de pretos, pardos e indígenas deve ser destinado à pessoas que enquadrem-se desta forma;

As cotas raciais em concursos públicos

No dia 10 de junho de 2014 começou a vigorar a Lei 12.990, que define uma porcentagem das vagas de concursos públicos para pessoas negras e pardas, constituindo-se em uma forma de tentar amenizar a desigualdade social, econômica e educacional entre as etnias/raças.

O corpo da lei reserva por volta de 20% das vagas em concursos públicos para a administração pública federal, direta e indireta, para autarquias, agências reguladoras, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista sob controle da União.

Podem concorrer às vagas da cota racial todos aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no momento da inscrição no concurso. Entretanto, deve-se atentar para os critérios do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística – IBGE. (Arts. 1º e 2º).

Esses candidatos podem disputar tanto às vagas destinadas às cotas, quanto as vagas de ampla concorrência. Todavia, se o candidato for aprovado na ampla concorrência, seu nome não será contabilizado para o preenchimento das cotas (Art. 3º, § 1).

Toda vez que o contingente de vagas ofertas no concurso público for igual ou superior a três, haverá a cota racial. No contexto em que 20% das vagas culminar em um número fracionado, será arredondado para cima sempre que a fração for igual ou maior que 0,5, e para baixo quando for menor que 0,5. (Art. 1º, §§ 1 e 2).

A determina que o critério racial seja determinado por intermédio da autodeclaração. Desse modo, tem-se que os candidatos pretos e pardos são reconhecidos quando assim o declararem no momento da inscrição.

As declarações atravessam um processo que recebe o nome de investigação social, onde são verificados os dados e informações fornecidos pelos candidatos.

Há, ainda, as hipóteses de denúncias realizadas por cidadãos e apuradas pelo Ministério Público. Caso seja comprovado que uma declaração é falsa, o aprovado será eliminado do concurso. Se ele já estiver no serviço público, pode ter sua nomeação anulada, dependendo, entretanto, de um procedimento administrativo prévio.

O que o STF decidiu sobre as cotas para negros e pardos em concurso?

O STF decidiu pela constitucionalidade das disposições da Lei nº 12.990/2014, que trata a respeito das cotas para negros e pardos em concursos públicos.

O julgamento foi proferido por meio da Ação Direta de Constitucionalidade nº. 41, que culminou em uma ementa.

A decisão é essencial pois encerra uma infinidade de questionamentos relacionados a constitucionalidade da lei. Exatamente por essa razão foi proposta uma Ação Declaratória de Constitucionalidade, uma vez estava havendo dúvidas na aplicação da norma, e, para evitar ao máximo as decisões conflitantes e garantir a segurança jurídica, o STF foi instigado a se manifestar.

O STF compreendeu que a reserva de vagas para negros e pardos não fere o princípio da eficiência, ao passo em que os candidatos que escolherem disputar as vagas nos requisitos da lei de cotas precisarão,assim como os demais, realizar concurso público. Essa era uma dos principais perguntas que se efetuava sobre a lei.

Vale salientar igualmente que, no que concerne a Constituição de 1988 não ter estabelecido que a Lei determinasse vagas para negros e pardos, do mesmo modo como fez com a questão das pessoas com deficiência, é plenamente possível que o Ente Federativo, através de uma lei, elabore essa regra. Um exemplo disso são os Estados da federação que criaram cotas para pessoas com deficiência.

Na referida decisão, o STF assumiu o modelo da autodeclaração e de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que seja respeitada a dignidade da pessoa humana e assegurados o contraditório e a ampla defesa.

É importante falar que o STF admitiu, de acordo com aquilo que está previsto na lei, um critério misto de autodeclaração e avaliação posterior. Em outras palavras, ao se inscrever para um determinado concurso público, a pessoa, se for o caso, deve se autodeclarar negra ou parda e, em etapa posterior, passará por uma espécie de comissão que efetuará a avaliação disso.

As intensas discussões sobre o sistema de cotas e por que elas são importantes e necessárias

A lei de cotas em universidades foi algo legalmente instituído em 2012 e suscitou muitas discussões, tornando-se até mesmo uma questão por vezes cercada de polêmica. Argumentos contra e argumentos favoráveis ao sistema de cotas foram levantados.

O compromisso e a responsabilidade do Direito brasileiro é criar todas as condições possíveis para que existam a igualdade e equidade entre pessoas que vivem sob condições de desigualdade.

As leis de cotas tem justamente esse objetivo: gerar a igualdade entre diversos grupos sociais, dando a eles maiores oportunidades na vida em sociedade.

Para se ter uma noção, atualmente o índice de alunos oriundos de escolas públicas que entraram na USP atingiu a marca de 36,9% no ano passado.

Essas marcas variam de universidade para universidade, de faculdade para faculdade para faculdade. Em geral, eles correspondem a menos da metade dos candidatos aprovados.

Foi com a criação das cotas que, após alguns anos, as universidades federais, em geral, atingiram a marca de 50,6% de estudantes oriundos de escolas públicas.

Um dos argumentos mais utilizados pelos críticos das cotas em universidades públicas, por exemplo, trataria-se de uma medida paliativa, usada como um modo de tentar compensar o sucateamento do ensino público, onde as escolas não teriam a qualidade necessária para competir em pé de igualdade com as escolas particulares.

Outro argumento é de que os candidatos cotistas estariam “roubando as vagas” de outras pessoas.

Contudo, ambos os argumentos estão equivocados. Apesar de pertinente a crítica quanto a defasagem do ensino público, cabe ressaltar que levaria um tempo para lá de expressivo efetuar uma reforma completa e profunda para aumentar o grau de qualidade do mesmo e até lá esses candidatos continuariam ainda mais desfavorecidos.

Além disso, é importante dizer que quando um candidato cotista faz um vestibular ou concurso, ele está concorrendo, à priori, dentro daquelas vagas reservadas para as cotas. Isso por si só já é o bastante de derrubar o argumento falacioso do “roubo da vaga”.

No que se refere ao desempenho dos estudantes nos cursos, o Ministério da Educação e Cultura recebeu e ainda está recebendo pesquisas de diferentes instituições. Um estudo elaborado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte aponta que 25,3% dos alunos cotistas alcançaram eficiência acadêmica superior a 7 (o mais elevado considerado). Entre os estudantes de ampla concorrência, esse índice foi de 24,4%.

Esses dados acima também são úteis para derrubar o argumento de que um candidato cotista “rouba a vaga” de alguém. Mesmo quando o candidato cotista, que por lei pode concorrer pelas cotas e/ou ampla concorrência, disputa a ampla concorrência, a diferença do desempenho dele com os demais candidatos é decimal, quando não superior.

Quanto a questão das cotas raciais, os números ainda são bastante pequenos. No ano de 2005, ou seja, um ano após a implementação de ações afirmativas, somente 5,5% de pessoas negras frequentavam uma faculdade.

Dez anos depois, em 2015, 12,8% dos jovens negros com idade entre 18 e 24 anos adentraram no ensino superior, de acordo com uma pesquisa divulgada pelo IBGE.

Esse número é um claro reflexo do histórico de exclusão e discriminação das pessoas negras na sociedade brasileira.

Em 1888, quando a princesa D.Isabel assinou a lei imperial nº 3.353, mais conhecida como Lei Áurea, que serviu para libertar os 700 mil escravizados que ainda existiam em território, não foi implementada nenhuma medida para que houvesse a inclusão dessas pessoas na sociedade, largando-os à própria sorte em um meio profundamente racista, desigual e excludente.Isso persistiu mesmo após a proclamação da República em 1889 e tem reflexos até hoje.

Estatísticas do IBGE ainda evidenciam uma enorme desigualdade entre brancos e negros. Dados mais atuais mostram a taxa de analfabetismo das pessoas com 15 ou mais anos de idade : 8,3% de brancos e 21% de negros.

A média de escolaridade de pessoas com idade igual ou superior a 10 anos é de quase 6 anos para as pessoas brancas, contra 3 anos e meio para as pessoas negras. No que toca ao ensino médio, os brancos com 18 anos ou mais que terminaram o ensino médio foram de 22,7%, enquanto que somente 13% dos negros.

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2001, a porcentagem de estudantes negros com mais de dois anos de atraso escolar atinge 14% no Brasil. Entre os alunos brancos, a taxa se reduz pela metade: 7%. Além de tudo isso, somente metade dos estudantes negros, ao chegar ao 6º ano do Ensino Fundamental, tem a idade certa para o ano em que estuda.

Esses dados evidenciam que o fracasso escolar – compreendido como o baixo rendimento, repetência, abandono e evasão – afeta de formas distintas estudantes que integram grupos diferentes, quando são observados os aspectos étnico-raciais.

Esse é o objeto de estudo do artigo intitulado “Fracasso escolar e desigualdade no Ensino Fundamental”, da Paula Louzano, professora e pesquisadora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP).

Recentemente circulou pela Internet um argumento contrário às cotas que um branco poderia ser reprovado com nota 9 no vestibular, enquanto que uma pessoa negra conseguiria entrar somente com nota 5.

Esse argumento, contudo, é equivocado e não corresponde à realidade, ou seja, é algo impossível de acontecer.

Isso tudo também se aplica no que se refere aos concursos públicos. Quando o assunto é o funcionalismo público, a desigualdade racial é bastante flagrante.

Um levantamento efetuado pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) baseada em dados fornecidos pelo Ministério do Planejamento aponta que do contingente total de 519.369 servidores públicos civis do Poder Executivo federal que declararam a cor/raça no Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos (Siape), apenas 30% são negros.

A defasagem da porcentagem de negros no serviço público em comparação à parcela de negros na população brasileira, que é de 50,7%, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é somente um dos pontos que atestam as dificuldades que essa parcela da sociedade tem de encarar no acesso ao mercado de trabalho.

Mesmo quando os negros possuem o mesmo grau de escolaridade de pessoas brancas, os rendimentos médios são menores. Esse é um dado oriundo de um estudo chamado “Os Negros no Trabalho”, que faz a análise da relação entre cor e rendimento em seis diferentes regiões metropolitanas e no Distrito Federal, a partir de informações do Sistema PED, que foi divulgado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) no dia 19 de novembro de 2013.

O Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA) divulgou uma nota técnica que concluiu que “Do ponto de vista da demanda por trabalho, o racismo bloqueia o acesso a oportunidades e interdita o crescimento profissional”.

As cotas sociais são relevantes pois elas auxiliam a “amenizar” um pouco das desigualdades sociais, permitindo que pessoas das classes mais desfavorecidas social e economicamente tenham mais chances de melhoras suas condições de vida.

No que refere às cotas raciais, elas são importantíssimas como uma ação afirmativa com o intuito de minorar a discriminação e o racismo institucional que permeia a sociedade brasileira. Não somente a desigualdade entre negros e brancos de modo geral é gigantesca, mas também entre negros e brancos de classes mais baixas, sem contar que a porcentagem de pessoas negras em condições sociais e econômicas precárias é muito maior do que a de pessoas brancas.

Por essa razão, está mais do que justificada a criação e implementação das cotas sociais e raciais.

 

FONTES: